2019-06-19

Pela concretização do Estatuto da Agricultura Familiar: CNA promove seminário com forte participação de Agricultores


A CNA promoveu no dia 14 de Junho, no Anfiteatro “Estúdio” do CNEMA, durante a Feira Nacional da Agricultura, em Santarém, o Seminário “Agricultura, Mundo Rural e Estatuto da Agricultura Familiar”.

Com a participação de muitas dezenas de agricultoras e agricultores de várias regiões do país, dirigentes associativos, representantes de organismos oficiais, técnicos, académicos e do Ministro da Agricultura, esta iniciativa foi mais uma importante etapa da CNA e filiadas na luta pela concretização do Estatuto da Agricultura Familiar (EAF), pela valorização da Agricultura Familiar e do Mundo Rural.

O Seminário foi aberto pela Engª Isabel Magalhães, que presidiu aos trabalhos, cabendo a primeira intervenção ao Ministro da Agricultura, Capoulas Santos, que reconheceu e felicitou o trabalho da CNA na divulgação Estatuto da Agricultura Familiar, salientando que “é um instrumento de política pelo qual a CNA se debatia há várias décadas, há 40 anos”.
Lembrou que o EAF visa discriminar positivamente os portadores desse título, citou alguns dos critérios que devem preencher os candidatos ao EAF e avançou que estão já em marcha algumas medidas da responsabilidade do Ministério da Agricultura, que se centram sobretudo na atribuição de pontos extra nas candidaturas a apoios ao investimento, referindo que outras medidas são da responsabilidade de outros Ministérios.

A CNA, enquanto representante da Agricultura Familiar na Comissão Nacional para a Agricultura Familiar (CNAF), que vai reunir já no próximo dia 28 de Junho, espera ouvir falar de mais avanços por parte do Ministério da Agricultura e dos restantes Ministérios envolvidos neste processo, pois, como se ouviu da plateia, por parte de agricultores presentes, “é preciso passar das palavras aos actos” e “sem sair do papel, o EAF de pouco serve aos Agricultores”.
Pela Direcção da CNA, o dirigente Alfredo Campos disse na sua intervenção que, apesar de se louvar obviamente a aprovação do EAF pelo Governo, no seguimento de uma proposta da CNA, no seu 7º Congresso em 2014, é preciso corrigir limitações e insuficiências do Decreto-Lei que o consagra (DL n.º64/2018), nomeadamente por não reconhecer o importante papel da mulher agricultora e por impor tectos demasiado baixos ao rendimento do agregado do Agricultor Familiar que pretenda obter o Estatuto.

Por exemplo, de acordo com a norma técnica que apoia o registo dos Agricultores na plataforma electrónica com vista à obtenção do título do EAF, o agregado familiar do agricultor não pode ter um rendimento colectável superior a 25 mil euros. Ora, numa família onde quatro elementos ganhem o ordenado mínimo, facilmente se atinge esse valor e ficarão assim excluídos deste estatuto – e das medidas que o concretizem – milhares de agricultoras e agricultores que a ele têm direito por natureza, por produzirem alimentos de qualidade e de forma harmoniosa com o território, preservando a cultura e a agrobiodiversidade, ocupando e mantendo o Mundo Rural vivo.

Como referiram os agricultores que intervieram durante o espaço de debate, a Agricultura Familiar, Portugal e a nossa Soberania Alimentar precisam de um EAF que dignifique a o trabalho – e o fruto desse trabalho – dos Agricultores e que valorize a qualidade dos seus produtos e não de um “título” miserabilista que funcione como uma compensação pelas dificuldades por que têm passado e passam os pequenos e médios agricultores. É, por isso, essencial criar condições para rendimentos justos que dignifiquem a vida e o trabalho das nossas e dos nossos agricultores. Tal passa, também, pela rápida e eficaz concretização do EAF com medidas como a criação de um regime de Segurança Social e fiscal próprios para a Agricultura Familiar, o acesso prioritário aos mercados de proximidade e ao abastecimento de todas as instituições públicas e da economia social da região onde se inserem as explorações, entre outras.

A CNA considera, por isso, que mais do que pôr em palavras, é necessário passar à efectiva valorização da Agricultura Familiar. Como referiu Alfredo Campos na sua intervenção, em linha com os compromissos assumidos pelo Governo Português também a nível internacional, com a aprovação das “Diretrizes para o Apoio e Promoção da Agricultura Familiar nos Estados-Membros da CPLP” e da “Declaração dos Direitos dos Camponeses e outras pessoas que vivem em zonas Rurais” na AG da ONU e com o impulso dado à Década da Agricultura Familiar (2019 – 2028), é indispensável e urgente que a nível nacional se dê corpo ao Estatuto da Agricultura Familiar.

O orador Pedro Reis, do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), com uma intervenção em que apresenta dados que realçam as particularidades e a importância da Agricultura Familiar, fala da necessidade de o Estatuto conter medidas como o apoio técnico aos agricultores, seja através do estímulo ao associativismo, seja através de instituições públicas e do próprio Ministério da Agricultura. Alertou também para a necessidade de envolver os consumidores, cada vez mais preocupados com a produção dos alimentos, e para a necessidade de valorizar a agroecologia no seu sentido mais lato e original, associada aos movimentos sociais.

Da parte da CNA, fica o compromisso de continuar vigilante e interventiva na reclamação das medidas concretas que dêem conteúdo ao Estatuto e de levar a voz das Agricultoras e dos Agricultores Familiares à próxima reunião da Comissão Nacional para a Agricultura Familiar.

Da mesma forma, a CNA continuará a lutar por políticas agrícolas e de mercados mais justas, por uma PAC – Política Agrícola Comum cuja base sejam os pequenos e médios agricultores e um modelo saudável e sustentável de Agricultura. Pois não será suficiente estabelecer um EAF com medidas para AF, se por outro lado nada se faz para combater a ditadura da agro-indústria e das grandes cadeias de hipermercados, que esmagam em baixa os preços na produção nacional; se adensa o rolo compressor de uma PAC que paga a quem não produz e que tem levado ao desaparecimento de centenas de milhares de pequenas explorações, isto num contexto internacional alargado em que se multiplicam os tratados de livre comércio com graves consequências para a Agricultura Familiar, para o Mundo Rural e para Soberania Alimentar dos povos.

Este seminário integra um projecto no contexto de uma iniciativa comunitária promovida pelo PDR2020 e co-financiada pelo FEADER, no âmbito do Portugal 2020.