2024-10-24
Editorial da Revista Voz da Terra n.º121
Está a evidenciar-se este ano de forma clara na Região Demarcada do Douro o resultado das políticas agrícolas e de mercados levadas a cabo nos últimos anos, ou nas últimas décadas.
Políticas que ignoram a maioria dos agricultores e das populações, em benefício de grandes grupos económicos e do poder financeiro, tudo em nome do seu sacro-santo mercado que, dizem, se auto-regula.
E é sob a batuta deste mercado liberalizado que, como é mais do que evidente, não se auto-regula, que no sector agrícola vão caindo por terra os agricultores e as explorações de menor dimensão.
As consequências são desastrosas a vários níveis. Concentração da produção e do comércio de bens agro-alimentares, desequilíbrios na distribuição de valor ao longo da cadeia alimentar que baixa preços para quem produz e aumenta para quem consome. As consequências sociais e ambientais também são de monta.
No sector do vinho os resultados saltam à vista. Um pouco por todo o país, pequenos e médios produtores foram sendo forçados a abandonar a actividade, pelos baixos preços a que vendem as uvas, pelos elevados custos e pela concentração da produção.
Este caminho está a ser trilhado a alta velocidade no Douro, onde milhares de pequenos e médios viticultores estão numa situação desesperante. Há mais de 25 anos que o preço pago pelas uvas se mantém igual e até mais baixo, apesar dos custos de produção aumentarem a cada ano. Trabalha-se com prejuízo, recebe-se com anos de atraso, entrega-se o fruto da vindima sem saber quanto é que os compradores vão pagar pelas uvas.
“Parece impossível”, dirá quem não sabe da poda. “Não é aceitável”, concordamos. Mas é isto que acontece, sabe-se, e sucessivos Governos deixam andar e não tomam medidas para apoiar os pequenos e médios produtores, que são a alma e o corpo desta região única no mundo. E assim se repete a receita pelo país fora (e não apenas no sector do vinho).
“É o mercado a funcionar”, dirá quem não quer saber da vida dos que ficam pelo caminho. “É também o resultado da liberalização dos direitos da plantação de vinha na União Europeia”, dizemos nós, que, como aconteceu com o fim das quotas leiteiras, arrasa com a quase totalidade das pequenas e médias explorações.
A CNA sempre se afirmou contra o fim dos direitos de plantação por ser contrário aos interesses da vitivinicultura familiar e das regiões tradicionalmente produtoras e, por isso, contrário ao interesse nacional.
O resultado deste caldo de políticas está à vista.
A poda que está a ser feita no Douro aos pequenos e médios viticultores é para deixar brotar apenas as grandes casas da transformação e do comércio exportador.
E quem ficará no Douro quando ele deixar de ser moda e o negócio noutro lugar for mais apetecível?
O tempo urge. É urgente apoiar – e salvar – os pequenos e médios agricultores da região, que com o seu trabalho mantêm viva a região e fazem dela património da humanidade.
Reclamamos a defesa da agricultura familiar e dos pequenos e médios viticultores do Douro e de todo o país!
A Direcção da CNA