2024-10-08

“Floresta, Floresta-minha rural que te ardeste. Dizei-me, há no mundo alguém mais ´reformador´ que eu?”

Vieram outra vez os violentos e extensos Incêndios Florestais / Rurais que voltaram a trazer o desastre, o drama e a tragédia.

É que, depois das datas fatídicas em 2017 e que, se vivesse, “o Poeta” também poria em versos lacrimosos – “e não as queira jamais o tempo dar” – o Governo de então produziu intensa propaganda, acompanhada de muita legislação, em torno do “slogan” grandiloquente do “o Governo vai fazer a maior reforma florestal desde o tempo do D. Dinis”. E assim banalizaram o “Rei Lavrador” enquanto nem sequer foram capazes de reflorestar o emblemático mas ardido “Pinhal do Rei” mais conhecido por “Pinhal de Leiria”… Sim, foi conversa (quase) oca… Em síntese, não faltaram anúncios de medidas com “chuvadas de milhões” em apoios públicos mas também como, e voltamos a citar “o Poeta”: “um engano de alma ledo e cego… que a fortuna não deixa durar muito”, em breve faltou o dinheiro para os concretizar. Aliás, o lamentável costume…

Ora, logo em cima do novo e trágico desastre ocorrido em vastas áreas, em meados de Setembro passado, em consequência dos ainda recentes e grandes incêndios Florestais / Rurais, logo veio o actual Governo tentar bater o recorde anterior também quanto aos níveis da propaganda para “intoxicar” a opinião pública. O primeiro anúncio, à procura de impacto, foi o da ajuda “até 500 milhões de euros dos Fundos de Coesão da União Europeia (UE)” que estão previstos até para os próximos anos como também foi dito pelo próprio Primeiro-Ministro. Ou seja, se vierem estes dinheiros, de facto, não são uma ajuda excepcional para acudir a prejuízos excepcionais como são os provocados por Incêndios ou outras catástrofes. Então, se vierem tais ajudas são uma espécie de “adiantamento por conta” e, assim sendo, a virem agora já não virão nos próximos anos…

E sim, nos dias e algumas noites em que, a Centro e a Norte, grassavam os grandes incêndios, foi o “Ministro-Adjunto e da Coesão Territorial” a vir ao terreno dar a cara que o Ministro da Agricultura esteve em “apagão” vários dias, ele que tão falador até gosta de ser…

Mais recentemente, dominados que estavam os incêndios, o mesmo Primeiro-Ministro veio re-anunciar que estão disponíveis “100 milhões de euros”. De nossa parte assinalamos as grandes “nuances” entre os números anunciados pelo Governo mas sobretudo reclamamos que os apoios públicos concretos cheguem depressa e com critério ao terreno e aos afectados pelos fogos e, desde logo, os tais 6 mil euros de ajuda de tipo simplificado e por Agricultor! E, claro, também todas as outras ajudas e mais ainda…

E agora, será que o actual Governo pretende fazer “a maior reforma da Floresta Nacional desde o tempo”… do Governo (PS) de 2017 e do terrível “Fogo Grande” desse ano?...

Entretanto, em Conselho de Ministros recente (26 de Setembro, 2024), foi colocada ao Ministro da Agricultura e Pescas uma tarefa supostamente candente pela sua oportunidade e importância. Assim, está este Senhor Ministro incumbido, pelos seus correligionários governamentais, de elaborar e apresentar – assim ao estilo das habituais  propagandas dos “100 dias” mas em que, desta vez, são 90 dias, contados a partir de 26 de Setembro – está ele incumbido da apresentação, nesse prazo, de um “Plano de Intervenção para a Floresta” por forma a valorizar a Floresta e a prevenir os Incêndios Florestais / Rurais.  Pois, pois diremos nós, “de boas intenções está o Inferno cheio” mas, ainda assim e pelos vistos, não cessa de arder… passe a analogia.

E caso o Ministro da Agricultura execute em três meses, pelo menos “no papel”, a tarefa para que ficou nomeado, o “seu” Governo PSD/CDS-PP poderá logo proclamar que vai fazer “a segunda maior reforma florestal desde o tempo de D. Dinis”, quiçá uma reforma ainda maior que a anterior proclamada pelo Governo PS vigente em 2017/18. Bem, isso até nem será muito difícil porque essa alegadamente “grande reforma florestal” anterior praticamente abortou, quer dizer, “antes de o ser já era”…

Para quê quererem “inventar a pólvora” das estratégias para a Floresta quando já há (por cumprir) a “Lei de Bases da Política Florestal” desde 1996?  Cumpra-se esta Lei pois! – deverá ser a síntese dos objectivos estratégicos em termos políticos, institucionais e também práticos!

Sim, já fez 28 anos, quase três décadas, que foi publicada a chamada “Lei de Bases da Política Florestal” aliás aprovada no maior consenso na Assembleia da República. Pode até dizer-se que constituiu um verdadeiro “pacto de regime” para o regime florestal no nosso País.

É a Lei n.º 33/96 de 17 de Agosto de 1966 e quem tiver curiosidade em a revisitar agora poderá constatar, por exemplo nas 13 Alíneas do seu Artigo 21º - “Acções com carácter prioritário”, que, por assim dizer, está lá tudo explanado naquilo que de mais estratégico deve ser considerado e desejavelmente executado, para se ter, bem “plantada no terreno”, uma correcta e eficaz política Florestal no nosso País. E, depois, também há definidos há bastante tempo, e até já revistos, os vários PROF, Planos Regionais de Ordenamento Florestal, com os correspondentes PGF, Planos de Gestão Florestal, de entre muita mais legislação. Portanto, para quê “inventar” agora aquilo que já foi “inventado”, ainda por cima uma “Lei de Bases da Política Florestal” aprovada, cremos que por unanimidade, na Assembleia da República?...

O problema é que, desde aí, passaram quase trinta anos com sucessivos governos que não tiveram vontade política para a concretizarem, para a “plantarem” nos territórios. Os resultados de tais opções anti-estratégicas estão desastrosa e tragicamente à vista e não adianta virem “chorar lágrimas de crocodilo”…

Sim é a “economia”! Sim é o (baixo) preço da Madeira na produção!...

De facto, a “fileira” da grande indústria de derivados florestais tem imposto, durante décadas, um continuado baixo preço da Madeira na produção. Eis o “epicentro” estruturante da perda de interesse económico na produção de Floresta por parte dos pequenos e médios Produtores Florestais, ao fim e ao cabo a esmagadora maioria.  Entretanto, o “sistema” foge em falar nisto como “o Diabo foge da Cruz” ou mais depressa ainda...

Pois muita falta faz “reformar” a cadeia de valor que se verifica na fileira florestal por forma a valorizar a Madeira enquanto matéria-prima, mas tendo especialmente em vista o aumento de rendimentos nomeadamente dos pequenos e médios Produtores Florestais. Ora, que também para isso haja coragem e vontade políticas de governos e governantes e de outros Órgãos de Soberania.

Entretanto, sim, também é possível e conveniente compensar rendimentos aos pequenos e médios Proprietários e Produtores Florestais, com a atribuição criteriosa e preferencial de apoios oficiais específicos à plantação e manutenção da chamada “Floresta Multifuncional” com esta mais bem adaptada, e mais resiliente, às alterações climáticas e aos Incêndios Florestais / Rurais. A floresta industrial mais intensiva, ainda que intercalada em “mosaicos” com variação de algumas espécies florestais, deve ser consignada a normas e a objectivos (regionalizados) para os quais é necessário constituir previamente amplos consensos políticos, ambientais e sociais, e fazê-los cumprir depois, por exemplo a nível dos tais PROF e correspondentes PGF, em estreita consonância com a “Lei de Bases da Política Florestal” em vigor.

Ora, se a Floresta é um sector de facto estratégico, afinal onde estão os apoios públicos necessários a isso mesmo?

Há registadas dezenas e dezenas de veementes declarações e muita legislação específica, saídas de sucessivos governos e governantes, em que é propalado o “sábio” ponto de vista em que a Floresta Nacional é considerada como um sector estratégico e por isto e por aquilo e por mais aquilo ainda. É justa uma tal valorização ainda que “teórica”!

Porém, por lamentável prática política e orçamental, sempre acaba por faltar as verbas públicas não só indispensáveis como muitas vezes incluídas em programas e mais programas de investimento na Floresta e na prevenção de incêndios florestais e, isto, apesar de ter sido bastante aumentada a verba pública destinada à prevenção.

E só como exemplos:

  • No PRODER, entre a verba inicialmente prevista e a verba efectivamente gasta, ficaram pelo caminho 130 milhões de euros, no PDR2020 ainda estão por executar 100 milhões euros nas medidas ligadas à floresta;

 

  • Na actual Programação o PEPAC que vai até 2030, as medidas ligadas à floresta ainda nem sequer estão regulamentadas e já o actual Governo se prepara para cortar para metade a verba destinada ao investimento na Floresta;

 

  • O “Vale Floresta”, alegadamente destinado a apoiar a limpeza da Floresta, atribui 600 euros por hectare até 10 ha mas para se fazer limpezas durante 5 anos, portanto uma verba insuficiente para cobrir gastos nesse período dos 5 anos, o que desencoraja candidaturas ao efeito pretendido;

 

  • O “Fundo de Emergência Rural” previsto no actual PEPAC ainda não foi regulamentado;

 

  • O PRR, vulgo “Bazuca”, foi anunciado com 614 milhões de euros para a Floresta mas em condições tais ou com tamanha falta de condições que medidas emblemáticas como os condomínios de aldeia tinham no final do ano uma “miserável” taxa de execução na ordem de 1%, quase nada!...

 

  • E as “AIGP, Áreas Integradas de Gestão da Paisagem”, a última “invenção”, de tipo vagamente associativo para a Floresta – aliás a sobrepor-se no terreno às “defuntas” ZIF, Zonas de Intervenção Florestal – as AIGP, dizia, não avançam no terreno apesar de terem sido muito poucos os projectos já aprovados, parte dos quais ainda nem sequer foi publicada em Diário da República!...

Ora, vem aí o debate sobre o Orçamento do Estado (OE) para 2025. É então muito conveniente que haja a vontade política de fazer incluir, no(s) futuro(s) OE, as verbas necessárias à consagração, de facto, da Floresta como sector estratégico e que as mesmo verbas venham depois a ser devidamente utilizadas!

Sim, é necessário e é muito conveniente que as sucessivas “promessas” sejam “plantadas” nos territórios e produzam Floresta sustentável a proporcionar o aumento dos rendimentos, nomeadamente, dos pequenos e médios Proprietários e Produtores Florestais!  Vamos a isso e assim seja!

João Dinis

(Pequeno Produtor Florestal do Interior)