2023-06-30

É justo lembrar e homenagear as maiores vítimas dos incêndios florestais de 2017

Mas é preciso mais, muito mais, para corrigir causas e consequências dos incêndios!

É justa e digna a recente cerimónia evocativa dos muitos mortos nos trágicos incêndios florestais ocorridos em Junho e em Outubro de 2017, na região Centro.

Viu-se que a emoção ainda está viva na recordação dos funestos acontecimentos. É natural que essas noites e esses dias continuam a “arder” dentro de nós os que lhes sobrevivemos, muitas vezes “apenas” porque tivemos mais sorte que outros...

Mas, agora, não basta evocar a tragédia seis anos após ela ter acontecido. Não basta reentrar em tiradas prenhes de mera propaganda às virtudes governamentais alegadamente envolvidas em não sei quantas medidas destinadas a corrigir o desastre económico e ambiental que se abateu sobre nós em 2017.

Vamos reconhecer que a acção pública mais meritória e eficaz recaiu, e ainda bem que correu muito razoavelmente, no apoio às indústrias mais afectadas pelo fogo. E que um dos grandes problemas e das maiores injustiças recaíram sobre milhares de agricultores que foram ressarcidos, os que o foram, a níveis discriminatórios por proporcionalmente inferiores aos atribuídos aos titulares dessas indústrias.  Já agora, diremos também que foi muito pouco o que recebeu a larguíssima maioria dos proprietários de uma dita “segunda habitação” queimada.

 

Continuamos sem reflorestação adequada desde logo nas áreas ardidas em 2017!  

Então que foi feito pelos Órgãos de Soberania e, em especial pelos Governos, nestes últimos seis anos, para estimular, de forma eficaz e participada, a reflorestação adequada das vastas áreas ardidas e assim decapitadas? Pois e apesar de tanta promessa pouco mais do que nada! Tremenda falha essa, aliás na base de um erro estratégico de amplitude vital. Continuamos sem Floresta ao de cima da nossa terra queimada onde sobretudo intervêm os grandes interesses económicos ligados às grandes fábricas de papel e de aglomerados a que agora se juntam as chamadas fábricas de biomassa-pellets.

Entretanto, surgem umas iniciativas, sem grande significado no território que é muito vasto, no domínio das chamadas AIGP – Áreas Integradas de Gestão da Paisagem, estas, onde as há, com alguma hipótese de vingar e assim se lhes seja assegurada uma gestão séria e competente, aspecto que merece a maior atenção de todos os envolvidos e das entidades promotoras em particular.

De facto, a incapacidade – técnica, financeira e de mobilização dos proprietários – por parte dos Ministérios da tutela e do Governo, aliás na companhia da maioria das Câmaras Municipais, uma tal incapacidade está a condenar-nos à continuação do desastre económico e ambiental que os pavorosos incêndios trouxeram e a doer.  E de nada nos serviu deixar de lhes chamar “Incêndios Florestais” para os designar por “Incêndios Rurais”.  Ora, uma tal situação e suas más perspectivas são do piorio que recai sobre as nossas cabeças, de nós os que continuamos a querer viver aqui no vasto interior mais os nossos familiares! 

O que mais mudou desde então, foi a forma como a GNR intervém no terreno!

É notória e gritante a falta de Floresta, onde a excepção são os eucaliptos. Em consequência, no terreno há, hoje, muito menos matéria – menos árvores – prontinha para arder, quer dizer, há bastante menos combustível. Mas há mais matagais e infestantes tipo a mimosa que não tem sido contrariada na sua progressão. Um incêndio que agora ocorra em condições climáticas propícias vai produzir menos CO2 para a atmosfera mas também vai ser rápido a progredir e com temperaturas internas capazes de fazer derreter “coisas”...  Aliás, esta má “experiência” já aconteceu.

E, neste novo contexto, da parte dos Bombeiros mantêm-se as principais dificuldades operacionais. Por norma, concentram os maiores efectivos nas imediações dos povoados e, por assim dizer, aguentam lá até que o fogo chegue perto para só então passar ao ataque directo ao flagelo. Enfim, não lhes faltarão razões para isso mas é um problema!

Efectivamente, a tragédia brutal com um tão elevado número de mortos e feridos em 2017 pesou tanto, tanto, que foram tomadas orientações rígidas com o objectivo de evitar acontecimentos com essa fatal dimensão, sendo a Protecção Civil das principais destinatárias e em especial a GNR.  De então para cá, nota-se bem, logo que inicia e se detecta um Incêndio, logo a GNR acode, em força, às vias de comunicação mais próximas para controlar o trânsito. E quando os fogos começam a achegar-se a uma povoação mais recôndita, logo se iniciam as acções de evacuação, “a bem ou a mal”, a começar pelos habitantes mais vulneráveis. Enfim, parece que o método, meio “violento” embora, tem dado resultados favoráveis pelo que não seremos nós a condená-lo, apenas o assinalamos...

Reflorestar! Reflorestar! Eis a questão vital que nos é posta até porque a “Água também se planta!”.

 

Vila Franca da Beira, Junho de 2023

João Dinis

(Cidadão rural, pequeno produtor florestal e dirigente associativo agrícola)