2020-01-30

Terminou a Mesa Redonda Regional "Agricultura Familiar e Acesso aos Mercados"

A CNA – Confederação Nacional da Agricultura, acolheu a Mesa Redonda sobre o tema "Agricultura Familiar e Acesso aos Mercados", nos dias 28 e 29 de Janeiro de 2020, em Coimbra, Portugal.

Estiveram presentes mais de 40 participantes, entre os quais, várias organizações agrícolas, nomeadamente a CNA e Filiadas, organizações europeias semelhantes, bem como a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a Universidade de Coventry (coordenação BOND) e os parceiros do BOND CCPV-COAG e SLG.

Esteve, também, presente o analista independente de política agrícola, Gérard Choplin, especialista em PAC no Comité das Regiões da UE, para um intercâmbio com os participantes.

Esta iniciativa visou analisar os desafios que a Agricultura Familiar enfrenta no acesso aos mercados e construir posições, reforçar a cooperação e as alianças entre organizações e reforçar a ação coletiva em torno das questões comerciais.

Após apresentações iniciais, o dia começou com uma sessão de gamming para colocar os participantes mais à vontade, tornando o espaço agradável e mais aberto para discussão. "Qual é a sua história? "uma actividade lúdica baseada em cartões que foram entregue e que consiste em criar histórias utilizando os cartões Pessoais, Contexto e Actividade, e partilhar a sua história com os outros intervenientes. No caso, e entrando no âmbito da discussão que se avizinha, os participantes partilharam histórias em torno das suas experiências agrícolas, lutas e aspirações.

Passando ao nível da própria discussão, analisou-se num contexto mais abrangente de "nível internacional", com uma abordagem à OMC e acordos de comércio livre (ACL) e os seus impactos; passando para o "nível comunitário" discutiu-se a deslocalização da produção vs. concentração no mercado europeu. A nível "local", a estratégia " Do prado ao prato" sobre alimentos sustentáveis em toda a cadeia de valor, anunciada pela nova Comissão Europeia no âmbito do "Pacto Verde Europeu", foi também um dos temas debatidos pelos participantes.

Com o debate em torno das alterações climáticas na ordem do dia, as questões ambientais e a agricultura familiar, modelos de produção mais sustentáveis e a deslocalização do consumo alimentar foram aspectos realçados durante o debate. Abordou-se também a dimensão social e económica da Política Agrícola Comum (PAC) e as políticas laborais, ambientais e de saúde na União Europeia.

Neste contexto, os participantes concordaram que a OMC, a proliferação de acordos de comércio livre e a PAC estão a ter impactos devastadores na agricultura familiar na Europa. E para o multi-disciplinar e importância da agricultura familiar (reconhecida a alto nível internacional, por exemplo, United Nations Decade on Family Farming 2019-2028), estes impactos negativos estendem-se rapidamente às paisagens únicas da Europa, biodiversidade, ambiente, cultura, tradições e à generalidade da sociedade, para além dos próprios agricultores. 

Com a qualidade dos alimentos dos cidadãos fortemente afectada pelo comércio "livre", uma vez que a procura de parâmetros de qualidade é reduzida, também o ambiente é severamente prejudicado pelo aumento do comércio de longa distância (especialmente por mar) sem estar sujeito a estudos de impacto ambiental.

Numa altura em que a Europa apresenta um "Pacto Verde" e se fala em reduzir as emissões poluentes com vista à neutralidade carbónica, não é coerente continuar a testemunhar a negociação desenfreada de acordos de comércio livre a nível global.

Para os pequenos e médios agricultores, os impactos das políticas têm sido visíveis a vários níveis: distorção da concorrência (dumping social, fiscal e ambiental); colapso dos rendimentos (o rendimento médio dos agricultores é 50% inferior ao salário médio noutros sectores); dificuldades de acesso a mercados; perda de emprego; abandono de explorações agrícolas; desagregação do tecido social e desertificação humana dos territórios rurais, entre outros.

Para inverter este caminho que está a condenar a agricultura familiar na europeia, deve colocar-se a soberania alimentar no centro das políticas, garantindo preços justos para a produção e um alimento de qualidade, nas proximidades e acessíveis aos consumidores. "Sem garantir preços justos e rendimentos justos, não há garantia de defesa para a agricultura familiar", mencionou um dos participantes.

É também necessária uma PAC forte, com instrumentos de regulação pública da produção e dos mercados, com uma repartição equitativa da ajuda, para aqueles que produzem, com base nos princípios da soberania alimentar.

Em alguns casos, as regras de qualificação para todos nem sempre significam justiça, uma vez que nem todos partem da mesma condição, como é o exemplo dos pequenos e médios agricultores. É igualmente necessário regular a aplicação dos Fundos de Investimento na Agricultura e proibi-los, por exemplo, de beneficiarem de ajudas públicas.

No contexto da Década das Nações Unidas sobre Agricultura Familiar, considerou-se também que a FAO deveria criar espaços onde se possa ouvir a voz dos agricultores familiares, e o mesmo deve acontecer na Comissão Europeia e no Parlamento Europeu.

Esta Mesa Redonda Regional permitiu uma reflexão colectiva sobre o tema do comércio e dos mercados, mas também para construir propostas e avançar para um plano de acção e estratégia comuns. Após dois dias de debate foi entregue A Declaração de Coimbra que resume as análises dos participantes, propõe uma lista de recomendações e criação de um grupo de trabalho sobre o acesso ao mercado das explorações familiares a nível europeu, reunindo as organizações agrícolas presentes na reunião.

 

Como ficou escrito na "Declaração de Coimbra", que resultou deste encontro, os participantes concordaram em continuar o intercâmbio, o trabalho e as propostas para um sector agrícola mais sustentável, saudável e harmonioso na Europa a longo prazo.